Crucifies my enemies....

sexta-feira, junho 24, 2005

O véu

Sou agnóstico e apolítico, tenho as minhas convições teóricas acerca de um mundo melhor, mas essas não se coadunam com o exemplificado pelos nossos representantes políticos.
Sou a favor da liberdade de expressão, a todos os níveis, cultural, de indumentária, religiosa, política.
Por isso me fez extrema confusão uma reportagem que tem estado a passar na SIC Notícias acerca do uso do véu nas escolas francesas.
Irrealista.
Compreendo que o problema em França, com a enorme quantidade de etnias oriundas do Magreb, seja manifestamente maior. Mas não compreendo o que um simples adorno corporal, usado pela razão que lhe queiram atribuir, religiosa ou não, impede o normal funcionamento de um estabelecimento de ensino. Proíbam os crucifixos em fios, os dizeres em t-shirts, melhor ainda, obriguem os alunos a irem nús para as aulas, só assim se obtinha coerência no que querem impôr.
Mas isso não o fazem. Um rapaz pode entrar de chapéu, uma rapariga não pode entrar de bandana. Não é justo, é castrador de uma liberdade fundamental, a ulteriormente citada liberdade de expressão.
Tenho dito.

15 comentários:

Anónimo disse...

atenção a um pequeno pormenor que pode fazer uma grande diferença. a bandana é permitida, desde que mostrem parte da testa e as orelhas.

Luke disse...

O que ainda torna mais ridícula a situação, portanto o mostrar as orelhas e a testa não é religioso. Obrigador por lembrar esse facto, o reitor do liceu Eugene Lacroix acha isso muito importante! ;-)

Luke disse...

e seria, obrigado por lembrar.. erro de simpatia...

Anónimo disse...

De facto, alguns pormenores ridículos assumem uma importância desmesurada quando se trata de questões que a maioria considera de segurança nacional.
Neste caso, infelizmente, um pormenor tão simples como um símbolo religioso (que de acordo com os direitos humanos estaria ao abrigo de uma coisa tão simples como a liberdade de expressão, direito natural esse tão caro ao homem dito ocidental) transforma-se num símbolo de terror, numa marca assustadora. Um pouco o mesmo efeito que a cruz da Santa Inquisição ou a cruz suástica do regime nazi terão tido por toda a Europa no passado, efeito este que infelizmente parece ter sido esquecido pelos franceses (ainda que tão afectados pelas respectivas consequências de tais filosofias e princípios de vida)

Eva Gonçalves, PhD Sociology disse...

Símbolo de terror é muito forte! Não acho que seja esse o caso aqui. Concordo com o que foi escrito no post e no comentário do eu de uma forma geral. Totalmente de acordo. Mas também não gostaria de ver esta discussão cair em radicalismos.
Tenho aqui de chamar a atenção para algo. As raparigas islâmicas também querem usar o véu dentro das salas de aula. E isso, comigo que trabalho com crianças e jovens, não poderia aceitar, visto que também chamo as crianças à atenção quando estão de boné, chapéus de palha, lenços ou outros adornos na cabeça.
A Liberdade de expressão, incluindo a religiosa, é um dos valores essenciais da sociedade ocidental, mas não se pode cair no erro de esquecer a Igualdade.

Luke disse...

Abismado pelo comentário, nomeadamente na minha concordância com o afirmado. Mas facto é que os franceses se desculpam com a ausência de simbolos religiosos nas salas de aulas, tais como cruzes ou outros que aludem a uma determinada religião. Não sendo, para mim, factor constitutivo de razão na questão em apreço, eles paralelizam uma situação à outra. Mas como afirmei, um aluno que leve consigo uma cruz ao peito não é impedido de entrar na escola, um aluno que leve um chapéu de uma equipa de basketball também não o é.
Obrigado pelo comentário.

Anónimo disse...

Abismado com o comentário??? Isso é positivo? Não que isso me preocupe. A discordãncia de opiniões é também um reflexo da liberdade de expressão.
Quanto ao radicalismo da questão, julgo que será muito difícil fugir dele, uma vez que o cerne do debate é nada mais do que uma medida radical.
Qualquer dia proíbem-se as mini-saias e os calções porque vão contra os princípios católicos da moral e bons costumes.
Proibir a utilização de chapéus numa sala de aula baseia-se numa questão de boa educação e bons modos, mas como em tudo as regras devem ser adaptadas às várias realidades, sendo que o véu é um príncipio incontornável da religião islâmica. E, julgo eu, isso remete para uma questão para mim também incontornável - o respeito e liberdade religiosa.

Eva Gonçalves, PhD Sociology disse...

Actualmente, a questão do véu islâmico é muito debatido. E isso faz com que nós os ocidentais mais aguerridos da liberdade e igualdade queiramos que os islâmicos tenham os direitos deles reconhecidos. No entanto, os próprios islâmicos estão a mudar o modo como olham o véu. Não digo que nos estados islâmicos mais fechados não seja o mesmo, mas em estados como Marrocos e Tunísia o uso do véu tornou-se algo que as mulheres usam por vaidade; em vez de maquilhagem usam o véu. Digo isto porque o vi, com os meus olhos, e falei com as pessoas. Depois investiguei sobre o assunto.
Na minha opinião o que deveriamos exigir, era que fosse possível, que todos pudessem escolher. Mesmo as raparigas islâmicas que não queiram usar o véu e a isso são obrigadas.

Luke disse...

Não deve preocupar, mas é deveras positivo e válido para ambos os comentários. Mais uma vez muito obrigado pelo interesse demonstrado e pela opinião expressa, que foi de inegável contributo.
Mas outra questão, referia-me, não ao interior da sala, mas ao exagero de ter de ser interdito no patio da escola. Sim, há que adaptar a boa educação ao meio em que estamos inseridos, mas não me vejo a censurar um arroto de um muçulmano após um jantar, nem a ser censurado por um por não o fazer. Agora se vim para uma sociedade, comigo trouxe os meus costumes e hábitos, tenho de fazer um esforço por me inserir. O que não dá direito à sociedade que acolhe de castrar, na sua totalidade, costumes que com um pouco de boa vontade podem coexistir com os existentes na citada.

Eva Gonçalves, PhD Sociology disse...

Já agora gostava de deixar aqui escrito o quanto me arrepia ver símbolos religiosos católicos espalhados pelas escolas e outras instituições deste país. Felizmente não é o único que o faz. 1.º porque as escolas recebem alunos de todas as etnias e de vários países como africanos, Índia, países árabes, 2.º porque cada pessoa devia ter liberdade de escolha na sua religião. Impôr símbolos religiosos não é positivo. Um antropólogo agarrar-se-ia aos cabelos e gritaria do fundo dos pulmões, visto que o seu objectivo é preservar a cultura milenar dos povos, mas na minha opinião, impôr símbolos religiosos impede o desenvolvimento pessoal e social.

Eva Gonçalves, PhD Sociology disse...

Luke, o que disseste no teu último comentário chama-se processo de aculturação. Cultura de origem e de destino aceitando-se e influenciando uma à outra. (mais outra coisa que deixa os antropólogos loucos!)

Eva Gonçalves, PhD Sociology disse...

É uma forma de dizer que concordo, não tinha o objectivo de te explicar o que é aculturação.

Luke disse...

Os antropólogos, pelo próprio objecto de estudo, são das pessoas mais racistas que existem. Mas num bom sentido. Acham que se devem manter as separações entre as variadas culturas de modo a manter os traços intactos. Mas lá está eu também era dessa opinião se corresse o risco de ficar sem emprego...

Eva Gonçalves, PhD Sociology disse...

Mas não podemos pedir a uma menino angolano que anda descalço, passa fome e passa a vida a fugir da guerra e a trabalhar desde cedo guardando o seu gado, que deixe de sonhar com os tennis, a coca-cola e com as cidades bonitas que vê nas televisões quando vai à cidade, e que em adulto tente concretizar o seu sonho. Nem por motivos, altruístas no sentido principal, de preservar a sua cultura e os seus rituais, nem porque a sua presença retira a oportunidade de emprego a alguém.

Eva Gonçalves, PhD Sociology disse...

Agora não posso deixar de concordar.