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terça-feira, junho 21, 2005

Jean-Paul Sartre centenário da liberdade

A voz sábia desse pensador moderno ainda ecoa em prol da liberdade para a expressão da vida, continuando atual e forte, embora necessite das bem-vindas ondas da rememoração.

A voz sábia desse pensador moderno ainda ecoa em prol da liberdade para a expressão da vida, continuando atual e forte, embora necessite das bem-vindas ondas da rememoração. Jean-Paul Sartre, filósofo destacado, criativo e audaz romancista e dramaturgo, biógrafo e jornalista que iluminou o século XX com a amplitude de suas idéias e ideais, teria seu 100º aniversário de nascimento comemorado no próximo dia 21 de junho, mas em Paris a imponência do centenário desse emblemático intelectual, politicamente engajado e um dos maiores expoentes do existencialismo já tem contornos de festa e resgate cultural.

O ''filósofo da liberdade'', como era reconhecido, ganhou desde o início do mês (Maio) uma grande mostra na capital francesa, entre vários eventos, como seminários, colóquios - como o sobre as perspectivas da obra de Sartre no século XXI, que vai acontecer entre 20 e 30 de julho em Cerisy, na Normandia -, leituras radiofônicas de peças teatrais e lançamentos de suas publicações, que vão reunir estudiosos desse grande homem e as chamadas ''sociedades sartrianas'', composta por centenas de pessoas de diversos países, incluindo o Brasil. Mas a lembrança de Sartre, que faleceu em 1980, vítima de um edema pulmonar, vai ser devidamente revista num local que impõe sua dignidade, a Biblioteca Nacional da França, em Paris, que até o dia 21 de agosto deixa em cartaz uma exposição com pelo menos 400 registros de Jean-Paul Sartre, entre manuscritos, correspondências inéditas, edições originais, jornais e pôsteres ligados a sua vida e obra, assim como retratos dele da autoria do amigo Cartier-Bresson e pinturas de Picasso.

Montada de forma cronológica, a mostra revê a infância do garoto que perdera o pai, oficial da Marinha, com apenas dois anos, seguindo pela ascensão etária e intelectual de Sartre, como estudante de filosofia, contemporâneo da Segunda Grande Guerra, quando foi preso, até tornar-se a notória figura da ''resistência intelectual''. Sartre concebeu os ditames da filosofia existencialista, integrando ativamente os movimentos revolucionários de maio de 1968 na França, assim como disseminou junto à mulher, Simone de Beauvoir, as novas linhas dos relacionamentos amorosos, entre casais independentes e amantes civilizados. É esse homem das letras, atos e inquieta livre argumentação, que retirou do gueto criadores de respaldo como Jean Genet, que tem sua existência reavivada.

Na mostra da Biblioteca Nacional da França, uma parceria com o Instituto Francês do Audiovisual possibilita o vislumbre de vídeos e gravações de entrevistas com Sartre, exibição de adaptações de suas obras para o teatro, imagens vivas dele em família, com amigos, entre ações políticas e ativismos históricos. Enfim, a celebração do charme desse baixinho, vesgo e feioso, cujo engajamento e destemor trilharam os movimentos de esquerda no seu país e no mundo. Apesar de precisar ser ainda mais revisitada, a obra de Jean-Paul Sartre foi difundida em muitos recantos ao ser amplamente traduzida.

Dessa forma, o talento filosófico visionário de Sartre ainda pode ser lido em A Náusea, dos fundamentais O Ser e o Nada, Les Temps Modernes e L'Être et le Néant ao analítico As Palavras, assim como sua veia literária deve ser constatada na coletânea de contos e novelas O Muro e a diversidade como teatrólogo em O Diabo e o Bom Deus, As Moscas, A Prostituta Respeitosa e Entre Quatro Paredes, peça em um ato, recentemente relançada no Brasil pela editora Civilização Brasileira, escrita por e Sartre em 1944 e encenada no fim da Segunda Guerra Mundial, na qual ele reinventou o inferno em tons modernos e sem alusões meramente cristãs, para o tormento de seus personagens: o jornalista e literato Garcin, a funcionária dos Correios e lésbica Inês, e a fútil Estelle.

Aliás, o autor que desprezou o prêmio Nobel, e escreveu a trilogia Os Caminhos da Liberdade, composta dos romances Com a Morte na Alma, Sursis e Idade da Razão vai ter uma maior atenção acerca da magnitude de seus escritos, tanto que a prestigiada Editora Gallimard também vai lançar as obras completas dele para o teatro, a biografia Um Pensador para o Século XXI, escrita por Annie Cohen-Solal, fora uma coleção de livros em áudio. Enfim, Jean-Paul Sartre influenciou e deixou-se influenciar pela grandeza e a pertinência do pensamento, como uma das vozes mais representativas do seu tempo e deve assim manter-se para as novas gerações, como símbolo de quem quis reinventar o mundo, confrontando a devastação, a crise econômica e social e o totalitarismo bárbaro em prol do direito intelectual da expressão e do amor à liberdade.

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