Fatinha,
Permite-me que te chame assim. Porque, enquanto te chamar "Fatinha," não te
estou a chamar outros nomes que talvez fossem mais apropriados e que, se
formos sinceros, tu bem fizeste por merecer. Antes de mais nada, deixa-me
dar-te as boas-vindas neste teu regresso à pátria que durante tanto tempo
trocaste pelas branduras tropicais do Rio de Janeiro. Sentimos a tua falta.
Nós, os que verdadeiramente sabem apreciar o teu talento (e somos muitos).
Não me refiro à matilha pavloviana que aguardou ansiosamente o teu
regresso a Felgueiras e que acorrerá em massa às urnas para te devolver ao poleiro
que é teu por direito e pelo próprio nome que ostentas. Nós somos
diferentes. Somos os que sabem reconhecer o génio e a grandiosidade de um
gesto como fugir à polícia para fora do país e depois, ainda as tuas pegadas
não tinham sido varridas do aeroporto, dizer em conferência de imprensa que
te puseste na proverbial alheta para impedir que te fizessem uma injustiça,
pondo-te em prisão preventiva por perigo de fuga e em conjunto com
criminosos comuns. E tinhas razão. O que tens tu de criminosa comum?
Comum é a gentalha de cuja ingenuidade e ignorância sempre soubeste
aproveitar-te para benefício próprio e dos que te são próximos. Um criminoso
comum dá o golpe e foge para uma barraca abandonada na Cova da Moura. Não
poderá nunca dar golpes consecutivos durante anos, exercendo um cargo
público e dando-se ao luxo de fugir para Copacabana. De comum isso não tem
nada. E o que nos rimos quando apareceste na televisão com a pele amorenada
pelo Sol, de cabelo aprumado e aparelho nos dentes (como se a fuga fosse um
regresso à descontracção e preocupações estéticas típicas da
adolescência) ao lado daquele palerma brasileiro que muitos acreditaram ser
o teu advogado. O teu advogado aquilo. Como se aquela criatura algum dia
conseguisse atar os próprios sapatos sózinho sem acabar enforcado
num atacador, quanto mais convencer alguém a contratá-lo para fins de
representação jurídica. Mas ele lá ia aparecendo a teu lado nas conferências
de imprensa que davas nos intervalos da praia, dizendo as alarvidades por ti
concebidas para diversão dos teus concidadãos. Fazias aquele ar ultrajado de
donzela apalpada e berravas que não ias descansar enquanto não se fizesse
justiça, apelavas aos teus felgueirenses de estimação para não desesperarem
porque tu voltarias por eles (sempre por eles, pobres simplórios) e que
cabia à justiça (a justiça à qual tu fugiste) assegurar-se de que estavam
reunidas as condições para que o regresso acontecesse. A teu lado, o
"advogado" ia vociferando disparates jurídicos sobre habeas corpus e
quejandos. Tu lembras-te do habeas corpus? Que saudades. E agora, eis-te
finalmente regressada. Soubeste fazê-lo na altura certa, aproveitando o
movimento de recandidatura ("Movimento Sempre Presente" pois sim... que graça) que te permitiria gozar de uma saborosa
imunidade enquanto durasse a campanha eleitoral.
Permitindo-te até não dizer para já se assumes a candidatura à frente da
qual puseste os teus melhores macaquinhos amestrados para parecer que não
tens qualquer ânsia de poder, guardando esse momento para mais tarde, para
quando o "povo" começar a exigir-te que avances e possas fazer-lhe a
vontade, qual Dom Sebastião finalmente regressado e trocando a armadura por
um casaco de peles. O mais brilhante nisto tudo foi teres sido tu a pedir a
tua própria detenção à chegada a Portugal. Tamanho espírito de abnegação
nunca antes foi visto. E o golpe de génio de pedir a revisão da prisão
preventiva que te foi aplicada porque, afinal, já não podes interferir no
processo e até não há perigo de fuga porque voltaste de livre e espontânea
vontade. Repara bem nisto: não há perigo de fuga porque regressaste de livre
e espontânea vontade do Brasil para onde fugiste há mais de dois anos. Se
isto não é genial, não sei o que será. E realmente não há perigo de fuga.
Porque sabes bem que não precisarás de fugir outra vez. Conheces bem a
justiça que temos. O único incómodo era passar uns meses dentro até ser
julgada. Depois do julgamento, poderás ir à tua vidinha declarada inocente
com provas ou culpada sem elas. E, afinal, de que te acusam? De te teres
favorecido a ti própria, à tua família e aos amigos e conhecidos com
dinheiro que não era teu? E daí? Não é essa uma das compensações informais
de uma vida dedicada à administração autárquica? Pois, se não se puder
desviar uns cobres para o próprio bolso, uns carros de grande cilindrada,
umas vivendas com piscina e uns biscates jeitosos para a família e para os
que nos são queridos, é suposto dar-se alguém por satisfeito com o reles
salário de presidente da câmara? Isso não cabe na cabeça de ninguém. Que
sejas muito bem-vinda a casa, Fátima. Sei que ainda vais dar muito que
falar.
Um abraço sentido de um admirador dedicado
(thanks Dino)
Crucifies my enemies....
quinta-feira, outubro 13, 2005
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